Obras nas estradas diminuem segurança dos peregrinos
As obras nas estradas nos últimos anos tornaram menos segura a circulação dos peregrinos, porque diminuíram as bermas, alertou uma voluntária que há 25 anos presta apoio médico aos que rumam a Fátima
Maria José Vilas Boas, que desde 1984 faz parte do Corpo de Voluntários da Ordem de Malta, e ontem dirigia o posto de atendimento a peregrinos em Santa Luzia, Mealhada, disse à agência Lusa que têm surgido também novos tipos de lesões relacionadas com as obras nas vias.
«Os problemas nos músculos e nos tendões tem surgido mais. Antigamente havia algum espaço, mas com o alargamento das faixas de rodagem, os peregrinos ou circulam pela via ou vão com um pé no asfalto e outro na valeta».
Segundo a voluntária, tal situação verifica-se nomeadamente com a criação de uma terceira faixa de rodagem. Isso fez com que «em grande parte do percurso o traço da berma seja em cima da valeta», e «diminuiu o espaço de segurança» para a caminhada dos peregrinos.
Maria José Vilas Boas contou à agência Lusa que ao longo dos 25 anos de voluntariado a peregrinos nunca se deparou com uma situação de atropelamento como o verificado na madrugada de ontem na zona de Santa Maria da Feira, que causou ferimentos em nove, embora há uns anos atrás um despiste de uma viatura tenha posto em risco um centro de acolhimento da Ordem de Malta em Condeixa-a-Nova.
«Antigamente os peregrinos apareciam com muitos problemas de exaustão, muito mal calçados e mal alimentados. Hoje, o que se nota mais são problemas musculares e de tendões», nomeadamente nas articulações do tornozelo, que a voluntária relaciona com as condições de marcha na berma, com alguns percursos com um pé na valeta.
A dificuldade de circulação nas vias foi também realçada à agência Lusa pela peregrina Maria da Conceição Dias, residente na Trofa, ao dizer que «algumas vezes» a caminhada é feita «com um pé na valeta».
Durante a circulação de noite não descuram o uso de coletes reflectores e de lanternas a sinalizar a presença, e sempre que há alternativas circulam fora da via, acrescentou.
No centro de acolhimento do Corpo de Voluntários da Ordem de Malta em Santa Luzia desde terça-feira e até ao final da manhã de ontem tinha sido atendida uma centena e meia de peregrinos, muitos deles a necessitar de massagens nos pés, nas coxas e nas costas, e tratamentos às bolhas nos pés. Nenhum dos casos a inspirar particulares preocupações.
Movidos pela fé
Maria da Conceição Dias, que pela quarta vez peregrina a Fátima desde Famalicão, faz parte de um grupo de 19 pessoas que segunda-feira se concentrara no Porto e se fizera à estrada com a intenção de na manhã do próximo domingo estarem em Fátima para cumprir as promessas.
«Às vezes uma pessoa cansa-se mais, mas vai bem», confessou, uma opinião corroborada por outras companheiras de viagem, oriundas da Trofa e Maia, cujas mazelas não iam além de umas bolhas nos pés. Eram os casos de Maria da Conceição Azevedo, que pela segunda vez incorporava o grupo, e de Fernanda Machado, uma estreante, que se fizera à estrada para cumprir uma promessa a pedir a Nossa Senhora de Fátima ajuda para uma doença do filho, a padecer de um problema renal.
Cristina Moura, uma agricultora de Ribeirão, concelho de Famalicão, apesar de carecer de tratamento a problemas musculares nos membros inferiores, não abandonara a boa-disposição e a alegria de participar pela primeira vez na peregrinação.
«Não há nada fácil na vida. Isto é custoso para os pés, mas para a cabeça estou de férias», confessou à agência Lusa, ao aludir quotidiano difícil na agricultura e à condição de desemprego do marido.
Cristina Moura admitiu que pensava ser mais custoso ir a pé a Fátima, apesar dos problemas nos pés e nos tornozelos que suscitaram o tratamento pelos voluntários da Ordem de Malta. «Durante o caminho canta-se, reza-se e chora-se quando há mais cansaço e apertam as saudades do marido e dos filhos», uma menina de 14 e um rapaz de 7, observou.
Às portas do município da Mealhada a agência Lusa interpelou um outro grupo, de 25 peregrinos oriundos de Braga, que caminhava desde as 00h00, desde Albergaria. Saíra de Braga à meia-noite de domingo e esperava chegar ao meio-dia de sábado a Fátima.
Conceição Fail, que há cinco anos vai a pé a Fátima, revelou à agência Lusa que os problemas sentidos são os habituais - algumas bolhas e dores musculares - minimizados por uma equipa de apoio que segue com eles, com dois podologistas e viaturas com cozinhas de campanha para os ajudar no restabelecimento das forças.