Tomaz Morais: «Temos uma palavra a dizer»
APURAMENTO PARA O MUNDIAL É O OBJECTIVO
RECORD - O apuramento para o Mundial é o grande objectivo para 2009?
TOMAZ MORAIS - Sim. A FPR traçou como primeira prioridade estratégica o apuramento para o Mundial de 2011. Tendo 3 jogos em casa com adversário directos nessa luta – Rússia, Espanha e Alemanha – é fundamental que Portugal consiga essas 3 vitórias e que, depois, ganhe a confiança necessária para tentar vencer na Geórgia e na Roménia. Já o fizemos na Geórgia, embora todos saibamos que está muito forte: tem o 15 todo a jogar na Pro D1 e Pro D2 de França, é uma equipa com muita experiência. O jogo com a Roménia, no ano passado, foi talvez um dos mais azarados da minha vida e, ao mesmo tempo, não soubemos ganhar. Mas a equipa está muito renovada, a trabalhar muito – talvez mais do que alguma vez trabalhou – e penso que os resultados vão aparecer.
R - A experiência adquirida com a participação no Mundial de 2007 pode ser mais-valia para este objectivo?
TM - Sim, mas os outros também a têm. Não vejo isso como um factor que possa desequilibrar. Se todos os jogadores estiverem disponíveis temos uma palavra muito séria a dizer neste apuramento e, quem sabe, talvez possamos garantir logo um dos dois primeiros lugares, que dariam o apuramento directo para a Nova Zelândia. Terá de ser essa, sempre, a primeira intenção.
R - Depois deste período de renovação da Selecção Nacional, sente uma grande diferença entre a qualidade dos dois grupos?
TM - Não. Neste momento temos, inclusivamente, um grupo muito equilibrado. Jovem, de jogadores com muita qualidade, que estão a trabalhar muito. Mas, em algumas posições, nomeadamente na 1.ª e 2.ª linhas, tínhamos jogadores com certo traquejo, muita experiência e com peso também. E, neste momento, não temos. A contratação de Murray Anderson e o facto de termos um especialista para trabalhar naquela área do jogolevam-me a pensar que, em Fevereiro, apresentaremos um 5 da frente capaz de ganhar os jogos. Porque ainda é o 5 da frente que ganha os jogos e é isso, nitidamente, que Portugal precisa que aconteça.
R - Existem, no nosso campeonato, jogadores estrangeiros que possam “reforçar” a Selecção Nacional?
TM - Isso é uma falsa questão, porque o único jogador que estará, a curto prazo, disponível para jogar na Selecção é o Joe Gardner, em Outubro de 2009, pois só aí vai cumprir, na verdade, os 36 meses. A lei é clara. Independentemente de os jogadores serem portugueses, têm de cumprir 36 meses consecutivos no país onde estão e, durante esse tempo, só podem-se ausentar por 59 dias. A maior parte dos jogadores que cá estão não cumprem esses requisitos, porque quando o campeonato pára regressam aos seus países ou vão para outros e passam mais de 60 dias fora. Logo, volta à contagem zero. E há muitos jogadores que temos imensa pena, porque são atletas de qualidade que não podem jogar na Selecção, uma vez que não estão legais por essa via. Depois, é importante dizer que só utilizamos na Selecção Nacional jogadores que já tenham a dupla nacionalidade, passaporte e bilhete de identidade portugueses.
R - Como tem corrido o projecto de prospecção e recrutamento de luso-descendentes no estrangeiro?
TM - Bem. Este ano descobrimos um jovem com valor: Julien Bardi, na 3.ª linha. Nas posições onde estamos mais à procura descobrimos o David Reis, que já não é um jovem, mas um jogador de 30 anos que joga numa divisão muito inferior em França e, de qualquer forma, demonstrou ter muito coração. Isso é importante para jogar na Selecção. De resto, estamos muito atentos e temos lançado muitos jogadores nas Selecções de Sub-21 e Sub-19 neste último ano e meio, acompanhando o seu desenvolvimento. Mas na Selecção sénior só estarão jogadores que sentirmos venham fazer a diferença e que tragam mais-valia como o David Penalva. Esse é o caso mais evidente. Um jogador que descobrimos com 19 anos e, é bom que se diga, aprendeu muito connosco também. Desenvolveu-se muito a jogar em Portugal e, depois, teve a oportunidades de outras portas abertas em França. Este é um bom exemplo, mas os jogadores devem ter qualidade. Já temos chamado outros que chegam cá e não têm o valor esperado. Estamos atentos mas também temos de sentir – e essa sempre foi a minha missão aqui – que, em primeiro lugar, é preciso desenvolver os jogadores portugueses. Aqueles que cá estão, estão connosco. Criamos uma boa relação entre todos, mas não vamos entrar em loucuras e jogar com 15 jogadores que actuam fora de Portugal.
R - Há garantias de que não voltará a ter problemas com a dispensa de jogadores que actuam no estrangeiro?
TM - A minha garantia única é a Lei 9 da IRB que diz que os atletas, em jogos de apuramento para o Campeonato do Mundo, têm obrigatoriamente de ser libertados pelos clubes. E uma segunda garantia é que esses mesmos atletas queiram jogar. Se quiserem jogar, ninguém pode ir contra a vontade deles. Uma coisa definimos: não vai acontecer o mesmo que no ano passado, fase que foi de transição. Vamos jogar com a equipa que cá estiver e deseja mesmo jogar.
R - E não há o perigo de esses clubes pressionarem os jogadores para que não venham representar a Selecção Nacional?
TM - Vai haver! Agora, os jogadores têm de saber o que querem. Pressão na vida há sempre. Eles é que têm de decidir se querem estar com Portugal e se querem jogar os jogos a que têm direito. Por exemplo, com o Canadá não fomos buscar os jogadores aos seus clubes. Mas nestes jogos, se estiverem no primeiro, vão estar em todos. Queremos uma equipa que comece e acabe a campanha.
R - Chegou a dizer que a experiência no estrangeiro não estava a ser positiva para alguns jogadores. O êxodo a que se assistiu após o Mundial não correspondeu ao que se esperava?
TM - Não posso dizer isso assim... Gonçalo Uva, neste momento, é titular do Montpellier, uma das melhores equipas do campeonato francês e da Liga Europeia. Para ele, com certeza que esta experiência está a ser muito boa. Também para o José Pinto que, em Itália, tem jogado regularmente numa posição chave que é médio de formação; para o Cristian (Spachuck), penso que está a ser positiva mas joga pouco e, quando um jogador não actua, obrigatoriamente baixa... Não chega só treinar e estar a um nível superior. O treino também é dado cá. Não é pelo treino que se faz a diferença. O jogo e o ritmo é que podem fazer a diferença e aí, realmente, no ano passado saíram muitos jogadores mas nem sempre jogaram e isso não lhes permitiu evoluir. Foi uma experiência conseguida para uns e menos conseguida para outros. Mas é sempre uma experiência importante.
R - Chegaram a ser dados passos no sentido de resolver os problemas que existiram com as entidades patronais e escolares dos jogadores?
TM - Não tenho conhecimento total disso. Sei que, muitas vezes, temos problemas, nomeadamente com as Universidades. Com as entidades patronais temos conseguido solucionar melhor. Agora, por termos criado o Centro de Treinos e as coisas estarem bem divididas durante o ano, espero que não haja esse problema uma vez mais. Senão estamos a andar, outra vez, 4 anos para trás. Espero que aí haja uma grande resposta da FPR para com as Universidades e entidades patronais para que isso não aconteça.
R - Pelo meio do apuramento, aparece o Mundial de Sevens... Em que medida isso pode afectar o desempenho em ambas as vertentes?
TM - Afecta sempre! Porque neste momento temos uma equipa de Sevens capaz de ombrear com as melhores do Mundo e de surpreendê-las. Já o fizemos. Desde o torneio de Londres que estamos a jogar de igual para igual com qualquer adversário. E o facto de calhar ali mesmo no meio não nos permite trabalhar os Sevens como gostávamos e como sabemos. Terá de ser, para nós, uma competição secundária. E estamos a falar de um Mundial porque 80% dos jogadores ainda têm de ser os mesmos. Queremos que, no futuro, isso não aconteça mas, para já, ainda não temos outra hipótese. Isto acontece porque os países mais pequenos ainda necessitam de ter jogadores em ambas as variantes, o que não vai acontecer com os países mais evoluídos. Até porque eles não têm estes jogos, em Fevereiro, de qualificação para o Mundial. Se quiserem colocar algumas mais-valias da selecção de XV a jogar no Mundial de Sevens podem fazê-lo. Tivemos este percalço, por isso definimos como grande prioridade participar no Campeonato do Mundo e não colocar qualquer objectivo específico, a não ser chegar lá, fazer o melhor possível e aproveitar os 10 dias que temos antes da prova para tentar maximizar o sistema de jogo e, depois, chegar lá o melhor possível. Vamos utilizar uma estratégia que é: à segunda-feira separamos, em treinos específicos, as linhas adiantadas e as atrasadas. E aí, nomeadamente no mês de Janeiro, vamos continuar a dar ritmo de sevens aos jogadores para que não percam esse contacto.
R - Tendo em conta todas estas condicionantes, o que seria uma boa participação no Mundial de Sevens?
TM - Se conseguíssemos igualar, pelo menos, o 10.º lugar do Mundial de 2005 em Hong Kong já era muito bom. As equipas vão aparecer muito reforçadas, mas, se tivermos um grupo favorável e conseguirmos manter todos os jogadores em boas condições até lá, estou convencido de que podemos ir um pouco mais além.
R - Como se explica a discrepância entre os resultados da Selecção Nacional de XV e os Sevens?
TM - É fácil. Nos Sevens, desde 2001 que estamos a jogar ao mais alto nível, com as melhores selecções, de uma forma algo sistemática. Ganhámos conhecimento, experiência e, agora, uma enorme capacidade física nos meses antecedentes ao Mundial e neste último ano em que os jogadores continuaram a trabalhar de modo especializado e com regularidade. Isso está a fazer com que a equipa portuguesa, fisicamente, esteja ao nível das melhores. Como já tinha râguebi e um bom sistema de jogo, isso permite que jogue de igual para igual com qualquer adversário. No XV não conseguimos fazer isso porque jogamos poucas vezes por ano, com adversários internacionais e ainda não temos, no 5 da frente, a experiência e a capacidade necessárias para elevar o nível do jogo. E também porque o XV depende muito directamente da competição interna que existe. Ela vai subindo mas ainda não está ao nível dos melhores países do Mundo. Nos Sevens conseguimos suprir isso com uma boa sistematização de treino e com os torneios a que vamos durante o ano.
R - Em Portugal também não há uma competição regular de Sevens...
TM - Não há, mas isso não se torna fundamental para conseguir resultados de nível superior, enquanto no XV é. Com certeza que, através de uma boa competição, vão surgir mais jogadores. Há muitos que têm a sua primeira experiência de Sevens logo a nível internacional e com a Nova Zelândia. Uma competição interna permitia suprimir isso ou, pelo menos, evitar que acontecesse. Estou convencido de que, em 2009 ou mesmo em 2010, haverá maior número de competições de Sevens e também que as pessoas vão querer participar. Muitas vezes são organizadas, mas só no ano passado é que tivemos um Nacional de Sevens com todos os clubes da Divisão de Honra em não sei quantos anos de existência. E, quem sabe, agora o segundo passo será fazer duas ou três competições em que eles participem todos. Porque nos Sevens isso é fundamental para desenvolver os jogadores.
"Rc"