IRN arrasa actuação da DGCI nas penhoras
A realização de penhoras electrónicas de imóveis a contribuintes com dívidas fiscais está a ser feita com graves deficiências e sem cumprir o protocolo assinado em Julho de 2007 entre os ministérios das Finanças e da justiça. A denúncia é feita pelo próprio Instituto dos Registos e do Notariado (IRN) que, em carta enviada à Direcção-Geral dos Impostos (DGCI), arrasa a actuação desta última entidade e acusa-a de nada fazer para ultrapassar os constrangimentos.
Os ministérios das Finanças e da Justiça, em declarações ao PÚBLICO, desvalorizam as críticas, garantindo que a “percentagem de erros é de 0,03 por cento”.
A imagem passada na carta enviada pelo IRN à DGCI é, no entanto, bastante diferente. O instituto tutelado pela justiça começa por lembrar que já em Março “foram elencados uma série de constrangimentos ao funcionamento do site das penhoras electrónicas, bem como aos procedimentos adoptados pelos serviços de finanças no envio dos pedidos de informação e dos próprios autos de penhora, procedimentos que nem sempre respeitam o acordado no protocolo de cooperação assinado com a DGCI”. Ora, estes constrangimentos foram comunicados à DGCI, mas, “decorridos cerca de três meses, constatamos que da parte da DGCI não foi emitida qualquer pronúncia sobre os constrangimentos por nós reportados”, lê-se na carta enviada em Junho à DGCI.
Mas o IRN vai mais longe. “Estranhamente, constatamos que as conservatórias voltam a deparar-se com o problema que inicialmente se verificou aquando do arranque do projecto, e que julgámos ter sido posteriormente ultrapassado, relativo à assinatura dos termos de penhora e à validade dos respectivos certificados digitais”, afirma.
Esta questão é importante porque é assim que se garante que não há penhoras feitas erradamente. Aliás, no protocolo assinado entre a justiça e as Finanças em 2007 ficou estabelecido que a comunicação da penhora para as conservatórias seria sempre feita com “a assinatura electrónica do chefe de finanças competente” e que só teria acesso a esses documentos o conservador competente ou os funcionários por si habilitados.
Não é o que está a acontecer. Segundo o IRN, são cada vez mais as conservatórias que reportam “problemas ao nível da assinatura dos autos de penhora, com a agravante de, agora, alguns desses problemas se deverem a alterações feitas ao documento - posteriormente à sua disponibilização no site - que invalidam a assinatura do chefe de finanças”. Ora, diz o IRN, depois de contactados os serviços de finanças, estes informaram que as alterações se devem às novas avaliações feitas aos prédios, não avançando qualquer solução. Assim, os pedidos de registo ficam pendentes nas conservatórias, o que, para o IRN, “não pode continuar a verificar-se (…) sob pena de total incerteza e insegurança quanto à inalterabilidade dos títulos que são submetidos”.
Novos problemas
Mas não são apenas estas questões que preocupam as conservatórias.
Na carta enviada à DGCI são elencadas novas questões sobre a forma de funcionamento das penhoras electrónicas. O “envio de ofícios a solicitar o registo de penhoras que já se encontram efectuadas e cuja comunicação já foi, inclusivamente, feita à DGCI” é uma delas. Mas também há situações de envio de ofícios a solicitar o registo de penhoras com indicação de que os autos se encontram disponíveis, “sem que efectivamente essa disponibilidade se verifique”. Os problemas dos serviços de finanças no acesso ao site ou a existência de pedidos de penhora pendentes sem que seja enviado à conservatória o oficio a solicitar o registo também são referidos.
Neste último caso, esta é uma das obrigações assumidas pela DGCI no protocolo já que. ficou estabelecido que, “segundo o formalismo actual, a DGCI envia um oficio em papel por cada prémio objecto de penhora”.
Perante estes problemas, o IRN sustenta que há a “necessidade imperiosa, para o normal funcionamento dos serviços, da adopção de medidas, da parte da DGCI, tendentes a evitar que os mesmos continuem a verificar-se”. O IRN, na mesma carta, conclui assegurando que “será imprescindível (…) a intervenção urgente da DGCI na resolução dos problemas apontados” e lembra que muitos destes problemas “já haviam sido reportados na anterior informação deste departamento jurídico”.
O protocolo assinado por Justiça e Finanças
O protocolo de colaboração entre a Direcção-Geral dos Impostos (DGCI) e o Instituto dos Registos e do Notariado (IRN) foi celebrado em Julho do ano passado com o objectivo de assegurar a desmaterialização e aumentar a eficácia das cobranças de dívidas fiscais em processos de execução. Em termos práticos, o protocolo consente uma vasta troca de informação entre a DGCI e o IRN por via electrónica e que permite acelerar a penhora de bens aos contribuintes que não cumprem as suas obrigações fiscais. Os conservadores passaram a ter acesso, via Internet, a uma lista de comunicação de penhoras feita pela DGCI e, perante esta lista, as conservatórias enviam à DGCI a descrição do imóvel a penhorar e do respectivo titular. Com esta informação, e também por via electrónica, a DGCI comunica a penhora às conservatórias.
Percentagem de erro é de 0,03 por cento
O Ministério das Finanças garante que a percentagem de erros no sistema informático das penhoras electrónicas é mínima, ficando-se pelos 0,03 por cento.
O PÚBLICO tentou saber se a administração fiscal já teria dado alguma resposta ao Instituto dos Registos e do Notariado e se os problemas detectados já tinha sido corrigidos. Em conjunto, os ministérios das Finanças e da justiça responderam por escrito, não tendo, no entanto, abordado as duas questões em concreto. “O sistema informático das penhoras electrónicas em causa está implementado vai fazer um ano, operando com documentos e assinaturas electrónicas qualificadas e liga em rede através da Internet 371 serviços de finanças e mais de 300 conservatórias”, começa por esclarecer a resposta do Governo, adiantando de seguida que, “naturalmente que, não só pelo seu aspecto inovador na desmaterialização, como também pela quantidade de serviços de finanças envolvidos, haverá sempre pequenos problemas ou dificuldades sentidas entre o mais de um milhar de utilizadores que até aqui operavam com procedimentos em papel padronizados há muitas décadas, tendo agora passado a operar com um sistema inovador totalmente desmaterializado”.
Na mesma resposta, os ministérios salientam ainda que “tendo em atenção estes problemas, a Direcção-Geral dos Impostos (DGCI) e o Instituto dos Registos e do Notariado (IRN) criaram um grupo de trabalho permanente para apreciar e resolver todas as questões que se levantam na aplicação do sistema, tendo o grupo de trabalho reunido muitas vezes para apreciação e resolução de muitas questões”. Ou seja, prossegue a mesma resposta, “com frequência ocorrem trocas de informação entre a DGCI e o IRN relativamente a problemas sentidos em alguns dos 371 serviços de finanças ou das mais de 300 conservatórias, sendo provavelmente esta uma das situações a que o senhor jornalista teve acesso entre as muitas trocas de informação que felizmente ocorrem entre a DGCI e o IRN”. Por outro lado, “na aplicação do sistema, foram já concluídos cerca de 21.000 procedimentos de registo de penhoras electrónicas de imóveis, incluindo estes procedimentos pedidos de informação às conservatórias, respostas das conservatórias sobre a descrição predial, envio de cadernetas prediais, autos e comunicações de penhora, assim como respostas e confirmação dos registos definitivos, tudo em documentos electrónicos com assinaturas electrónicas qualificadas, com segurança e garantia de autenticidade dos documentos”.
Ou seja, “existem ainda várias dezenas de milhares de procedimentos da mesma natureza em curso, verificando-se que a produtividade dos serviços tem aumentado muito, sendo a evidência da eficiência do sistema e da sua rentabilidade”. Concluindo que “a percentagem dos pequenos erros é de 0,03 por cento”.
@ Público