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TIN
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1. Acompanhei o 25 de Abril. Era criança e faltei à escola. Estava doente. Não entendi muito bem o que se passou. Continuo a não perceber muito bem o que se passa.
Mais de três décadas depois, o país está melhor. Estará bem? As pessoas vivem melhor. Sentir-se-ão bem?
2. Abril significou, acima de tudo, liberdade.
A liberdade é conatural ao Homem. Miguel Torga expressou, com opulenta simplicidade e fulgurante sageza, esta percepção: «Só presto para ser livre».
Para Jean-Paul Sartre, «a escolha é sempre possível em algum sentido; o que não é possível é não escolher. Eu posso sempre escolher. Até quando não escolho, escolho: escolho não escolher».
De acordo com Xavier Zubiri, «o Homem é uma realidade que é a unidade intrínseca de evolução e liberdade. A matéria vai-se formando a si mesma por evolução; a pessoa vai-se fazendo a si mesma por liberdade. A unidade intrínseca de evolução e liberdade é justamente a pessoa humana».
3. A liberdade não existe em estado quimicamente puro. A liberdade é sempre a liberdade de alguém com alguém. É uma liberdade situada. O outro não é, portanto, o impedimento da minha liberdade, mas o parceiro (e, nessa medida, a oportunidade) da minha liberdade.
Só que a liberdade pode ser agredida. Por opressões do exterior e até por coacção do nosso interior. Temos de estar atentos pois podemos ser os coveiros da nossa própria liberdade.
É por tal motivo que a liberdade também precisa de ser libertada. S. Paulo não se esquece de nos recordar: «Foi para a liberdade que Cristo nos libertou» (Gál 5, 1). A história bíblica (no Antigo e sobretudo no Novo Testamento) é uma história de libertação. De libertação das opressões de toda a espécie. De libertação do mal, do pecado e da morte.
Esta história de libertação revela as marcas indeléveis do Libertador. Ele é oferta de liberdade quando opera a libertação. Por isso, «onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade» (2 Cor 3, 17). Se, à partida, qualquer decisão é uma certificação da liberdade, a oferta da própria vida é a expressão máxima da liberdade. Ao libertar-nos, Jesus liberta a nossa liberdade.
Assim sendo e voltando à terminologia de Xavier Zubiri, a liberdade acaba por ser sempre liberdade de e liberdade para. A primeira significa que o ser humano já não está dominado nem por forças nem por tendências nem por apetites. A segunda assinala que o ser humano é livre para ser o que deve ser, para ser ele mesmo.
4. Portugal é livre. Mas está a conseguir ser ele mesmo? Há uma tendência que vem de há muito e teima em persistir: nós, portugueses, sabemos sempre mais aquilo que não queremos do que aquilo que queremos.
Não queremos despovoamento, mas também não queremos natalidade. Não queremos abandonar o interior, mas também não queremos repovoar o interior.
Não queremos ganhar menos, mas também queremos produzir mais. Não queremos afastar-nos dos países desenvolvidos, mas também não queremos sair da cauda da Europa. Não queremos piorar o rendimento escolar, mas também não queremos aumentar a exigência no ensino.
Pelo menos desde há 100 anos, as nossas opções são sobretudo ditadas pelo que não queremos.
A República surgiu porque não queríamos mais a Monarquia. O Estado Novo apareceu porque não queríamos mais a desordem da República. A Democracia surgiu porque já não queríamos suportar mais o Estado Novo. O que queremos, afinal?
É o mal para o qual já Manuel Antunes nos alertava: somos mais dominados pelo negativo do que pelo positivo. Daí a nossa matriz depressiva e até a nossa apetência pelo fado.
Somos assim. Seremos capazes de ser diferentes?
Mais de três décadas depois, o país está melhor. Estará bem? As pessoas vivem melhor. Sentir-se-ão bem?
2. Abril significou, acima de tudo, liberdade.
A liberdade é conatural ao Homem. Miguel Torga expressou, com opulenta simplicidade e fulgurante sageza, esta percepção: «Só presto para ser livre».
Para Jean-Paul Sartre, «a escolha é sempre possível em algum sentido; o que não é possível é não escolher. Eu posso sempre escolher. Até quando não escolho, escolho: escolho não escolher».
De acordo com Xavier Zubiri, «o Homem é uma realidade que é a unidade intrínseca de evolução e liberdade. A matéria vai-se formando a si mesma por evolução; a pessoa vai-se fazendo a si mesma por liberdade. A unidade intrínseca de evolução e liberdade é justamente a pessoa humana».
3. A liberdade não existe em estado quimicamente puro. A liberdade é sempre a liberdade de alguém com alguém. É uma liberdade situada. O outro não é, portanto, o impedimento da minha liberdade, mas o parceiro (e, nessa medida, a oportunidade) da minha liberdade.
Só que a liberdade pode ser agredida. Por opressões do exterior e até por coacção do nosso interior. Temos de estar atentos pois podemos ser os coveiros da nossa própria liberdade.
É por tal motivo que a liberdade também precisa de ser libertada. S. Paulo não se esquece de nos recordar: «Foi para a liberdade que Cristo nos libertou» (Gál 5, 1). A história bíblica (no Antigo e sobretudo no Novo Testamento) é uma história de libertação. De libertação das opressões de toda a espécie. De libertação do mal, do pecado e da morte.
Esta história de libertação revela as marcas indeléveis do Libertador. Ele é oferta de liberdade quando opera a libertação. Por isso, «onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade» (2 Cor 3, 17). Se, à partida, qualquer decisão é uma certificação da liberdade, a oferta da própria vida é a expressão máxima da liberdade. Ao libertar-nos, Jesus liberta a nossa liberdade.
Assim sendo e voltando à terminologia de Xavier Zubiri, a liberdade acaba por ser sempre liberdade de e liberdade para. A primeira significa que o ser humano já não está dominado nem por forças nem por tendências nem por apetites. A segunda assinala que o ser humano é livre para ser o que deve ser, para ser ele mesmo.
4. Portugal é livre. Mas está a conseguir ser ele mesmo? Há uma tendência que vem de há muito e teima em persistir: nós, portugueses, sabemos sempre mais aquilo que não queremos do que aquilo que queremos.
Não queremos despovoamento, mas também não queremos natalidade. Não queremos abandonar o interior, mas também não queremos repovoar o interior.
Não queremos ganhar menos, mas também queremos produzir mais. Não queremos afastar-nos dos países desenvolvidos, mas também não queremos sair da cauda da Europa. Não queremos piorar o rendimento escolar, mas também não queremos aumentar a exigência no ensino.
Pelo menos desde há 100 anos, as nossas opções são sobretudo ditadas pelo que não queremos.
A República surgiu porque não queríamos mais a Monarquia. O Estado Novo apareceu porque não queríamos mais a desordem da República. A Democracia surgiu porque já não queríamos suportar mais o Estado Novo. O que queremos, afinal?
É o mal para o qual já Manuel Antunes nos alertava: somos mais dominados pelo negativo do que pelo positivo. Daí a nossa matriz depressiva e até a nossa apetência pelo fado.
Somos assim. Seremos capazes de ser diferentes?