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Soeiro Pereira Gomes nasceu há um século
Nasceu em Gestaçô, no norte, em 1909, faz terça-feira um século, e aos 22 anos fixou-se em Alhandra, para nela um dia se descobrir escritor e dela fazer cenário central da sua obra. Assinava Soeiro Pereira Gomes.
Viveu 40 anos - morreu em 1949 - e deixou dois romances, «Esteiros» e «Engrenagem», um livro de contos, «Contos vermelhos», crónicas.
A este contributo como escritor, e indissociável dele, há que juntar o que Soeiro prestou como cidadão e militante do Partido Comunista, ao qual aderiu, já em Alhandra, em finais dos anos 30 (são desencontradas as informações sobre o ano exacto dessa adesão).
Na então pequena vila ribeirinha do Tejo, Soeiro, empregado na Cimentos-Tejo, hoje Cimpor, envolve-se em actividades de dinamização cultural e desportiva. Organiza aulas de ginástica para os filhos dos operários da fábrica, impulsiona a criação de bibliotecas populares nas colectividades locais, participa na construção de uma piscina...
Nessa piscina haveria de «nascer», anos mais tarde, um campeão da natação de fundo, de «águas abertas» - Baptista Pereira, o rebelde Gineto dos «Esteiros».
Porque a isso o impele a sua consciência de militante, Soeiro, já então com um cargo dirigente no partido, participa na organização de greves e manifestações em Maio de 1944. Lutava-se contra o racionamento de bens essenciais, a carestia, o agravamento das condições laborais.
A PIDE já há algum tempo lhe seguia o rasto, procura-o - e Soeiro é forçado a entrar na clandestinidade. Como centenas de outros.
Os anos seguintes são de intenso, duro trabalho para o partido - com inevitável preterição da actividade literária.
Já então tinha sido publicada a sua obra maior, «Esteiros». O livro saiu em 1941 com ilustrações de Álvaro Cunhal.
Na homenagem ao escritor, na Sociedade Euterpe Alhandrense, à passagem dos 50 anos da sua morte, Cunhal recordou ter sido o próprio Soeiro a pedir-lhe que ilustrasse o livro.
«E assim fiz - contou -, certo, porém, de que os modestos desenhos não eram dignos do valor da obra literária. Observação atenta da vida, 'Esteiros' é um romance de profundos sentimentos de amor e ternura pelas crianças e transmite (sem o explicitar) a indignação pela exploração e miséria de que são vítimas».
«Esteiros» é hoje reconhecido como um dos títulos paradigmáticos do neo-realismo português. É a história do Gaitinhas, do Coca, do Maquineta, do Gineto, de outros garotos forçados pela fome ao trabalho nos esteiros, canais abertos pelo Tejo na margem alhandrense e de onde se retirava barro para fazer tijolo e telha (nos telhais).
«Esses garotos miseráveis (...) deram a Pereira Gomes a oportunidade de se destacar de entre todos os escritores da mesma geração e de tendência idêntica: porque, melhor do que nenhum, ele soube compreender as suas personagens, porque, como nenhum, as soube amar», escreveu Adolfo Casais Monteiro, poeta presencista e cunhado de Soeiro.
Publicado postumamente (1951), «Engrenagem», em cujo manuscrito o escritor deixou marcada a intenção de o rever um dia, é - na síntese de Urbano Tavares Rodrigues há anos publicada no jornal «Avante» - «uma incisiva análise das relações económicas e humanas numa vila ribatejana e numa fábrica de ferro e aço (semelhante nalguns aspectos à dos Cimentos-Tejo, onde o autor foi chefe de escritório) e verdadeira epopeia das lutas do operariado industrial» .
Os «Contos Vermelhos» têm como pano de fundo a vida clandestina dos militantes comunistas.
Sobre eles, também nas páginas do «Avante», escreveu o poeta e ensaísta Manuel Gusmão. «Contam acções de personagens em situações excepcionais, porque a clandestinidade política é um estado de excepção, por um lado porque é violentamente imposta, por outro, porque aqueles que a ela se decidem, sempre minoritários, o fazem para acabar com a situação que a impõe».
Dia 19 de Abril em Alhandra e entre Novembro e Fevereiro de 2010 em Vila Franca de Xira, Soeiro Pereira Gomes será alvo de homenagens: a primeira no Museu local (Casa Sousa Martins) e a segunda no Museu do Neo-Realismo.
Diário Digital / Lusa
Nasceu em Gestaçô, no norte, em 1909, faz terça-feira um século, e aos 22 anos fixou-se em Alhandra, para nela um dia se descobrir escritor e dela fazer cenário central da sua obra. Assinava Soeiro Pereira Gomes.
Viveu 40 anos - morreu em 1949 - e deixou dois romances, «Esteiros» e «Engrenagem», um livro de contos, «Contos vermelhos», crónicas.
A este contributo como escritor, e indissociável dele, há que juntar o que Soeiro prestou como cidadão e militante do Partido Comunista, ao qual aderiu, já em Alhandra, em finais dos anos 30 (são desencontradas as informações sobre o ano exacto dessa adesão).
Na então pequena vila ribeirinha do Tejo, Soeiro, empregado na Cimentos-Tejo, hoje Cimpor, envolve-se em actividades de dinamização cultural e desportiva. Organiza aulas de ginástica para os filhos dos operários da fábrica, impulsiona a criação de bibliotecas populares nas colectividades locais, participa na construção de uma piscina...
Nessa piscina haveria de «nascer», anos mais tarde, um campeão da natação de fundo, de «águas abertas» - Baptista Pereira, o rebelde Gineto dos «Esteiros».
Porque a isso o impele a sua consciência de militante, Soeiro, já então com um cargo dirigente no partido, participa na organização de greves e manifestações em Maio de 1944. Lutava-se contra o racionamento de bens essenciais, a carestia, o agravamento das condições laborais.
A PIDE já há algum tempo lhe seguia o rasto, procura-o - e Soeiro é forçado a entrar na clandestinidade. Como centenas de outros.
Os anos seguintes são de intenso, duro trabalho para o partido - com inevitável preterição da actividade literária.
Já então tinha sido publicada a sua obra maior, «Esteiros». O livro saiu em 1941 com ilustrações de Álvaro Cunhal.
Na homenagem ao escritor, na Sociedade Euterpe Alhandrense, à passagem dos 50 anos da sua morte, Cunhal recordou ter sido o próprio Soeiro a pedir-lhe que ilustrasse o livro.
«E assim fiz - contou -, certo, porém, de que os modestos desenhos não eram dignos do valor da obra literária. Observação atenta da vida, 'Esteiros' é um romance de profundos sentimentos de amor e ternura pelas crianças e transmite (sem o explicitar) a indignação pela exploração e miséria de que são vítimas».
«Esteiros» é hoje reconhecido como um dos títulos paradigmáticos do neo-realismo português. É a história do Gaitinhas, do Coca, do Maquineta, do Gineto, de outros garotos forçados pela fome ao trabalho nos esteiros, canais abertos pelo Tejo na margem alhandrense e de onde se retirava barro para fazer tijolo e telha (nos telhais).
«Esses garotos miseráveis (...) deram a Pereira Gomes a oportunidade de se destacar de entre todos os escritores da mesma geração e de tendência idêntica: porque, melhor do que nenhum, ele soube compreender as suas personagens, porque, como nenhum, as soube amar», escreveu Adolfo Casais Monteiro, poeta presencista e cunhado de Soeiro.
Publicado postumamente (1951), «Engrenagem», em cujo manuscrito o escritor deixou marcada a intenção de o rever um dia, é - na síntese de Urbano Tavares Rodrigues há anos publicada no jornal «Avante» - «uma incisiva análise das relações económicas e humanas numa vila ribatejana e numa fábrica de ferro e aço (semelhante nalguns aspectos à dos Cimentos-Tejo, onde o autor foi chefe de escritório) e verdadeira epopeia das lutas do operariado industrial» .
Os «Contos Vermelhos» têm como pano de fundo a vida clandestina dos militantes comunistas.
Sobre eles, também nas páginas do «Avante», escreveu o poeta e ensaísta Manuel Gusmão. «Contam acções de personagens em situações excepcionais, porque a clandestinidade política é um estado de excepção, por um lado porque é violentamente imposta, por outro, porque aqueles que a ela se decidem, sempre minoritários, o fazem para acabar com a situação que a impõe».
Dia 19 de Abril em Alhandra e entre Novembro e Fevereiro de 2010 em Vila Franca de Xira, Soeiro Pereira Gomes será alvo de homenagens: a primeira no Museu local (Casa Sousa Martins) e a segunda no Museu do Neo-Realismo.
Diário Digital / Lusa