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Rui Zink reflecte sobre insegurança no século XXI em novo romance

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Rui Zink reflecte sobre insegurança no século XXI em novo romance

Uma reflexão sobre o estado de permanente insegurança em que vivemos desde o início do século XXI é-nos apresentada pelo escritor Rui Zink no seu último romance, «O Destino Turístico», que será lançado domingo em Lisboa.

«[No livro,] acompanhamos um homem que vai passar uns dias a um destino turístico de horror, um teatro de guerra, tipo Bagdad, onde a cada momento nos pode cair um estilhaço em cima, vemos mulheres com filhos mortos nos braços a passarem à nossa frente, resultado de bombas de fragmentação, há gangs a raptarem turistas e observadores internacionais por todo o lado... Enfim, uma maravilha», disse Rui Zink em entrevista à Lusa.

Sobre a frase «O melhor destino é aquele que nos faz sentir em casa», impressa na capa do romance, editado pela Teorema, o escritor, professor universitário e tradutor, de 47 anos, comentou, com ironia: «É bonito, não é?».

«Essa frase é uma variante de várias frases turísticas, de vários lugares comuns. Há um que é muito bonito também: »A casa é onde está o nosso coração«. E de facto, o nosso coração surpreende-nos. Já o Almeida Garrett dizia que uma pessoa às vezes se apaixona por outra e a razão dizia-nos 'não te apaixones por aquela pessoa', mas a verdade é que acontece. E há pessoas que se sentem em casa num teatro de guerra. Eu, aliás, penso que metade da humanidade se sente bem no desconforto, senão as pessoas não se divorciavam tanto. As pessoas divorciam-se porque gostam da porrada», sustentou.

«Parece-me um tema muito actual - prosseguiu - o das pessoas que acham que querem uma coisa, mas na verdade querem outra. É como as pessoas que dizem 'ai, eu gosto muito de liberdade' mas preferem a segurança à liberdade, preferem um ditador a um democrata, ou as pessoas que - lagarto, lagarto - agora dão nas sondagens a vitória ao Obama, nos Estados Unidos, dizendo 'sim, senhor, vou votar nele, porque é evidente que é o melhor candidato, tem o melhor programa', mas depois, às escondidas, dizem 'o quê, eu, votar num preto?! Era o que faltava', só que não podem dizer alto que são racistas».

De acordo com o autor, «há pessoas que gostam de ser masoquistas e há pessoas que gostam de ser sádicas. O que acontece é que a maior parte dessas pessoas não pode confessá-lo».

«Nós dizemos também 'ai, eu estou tão solidário' - exemplificou - mas a quantos de nós causa incómodo, ao jantar, ver que em Bagdad houve mais uma explosão, ou que na Etiópia há mais não sei quantas crianças a morrer de fome? Em que é que isso nos incomoda? Não, não incomoda. E é disso que o livro trata».

Greg, o protagonista do livro, «é um turista e, ao mesmo tempo, é muito ingénuo, é alguém que não percebe, como às vezes as pessoas das ONG, que vão para ajudar mas não percebem nada».

«Por exemplo, se fôssemos ver as várias missões portuguesas a Timor nos últimos anos, quantas delas foram úteis e ajudaram de facto o país?», interrogou-se, acrescentando: «O inferno está cheio de missionários bons que não contribuem para matar a fome das pessoas que tentam ajudar, excepto quando lhes servem de cozinhado».

Para explicar como lhe surgiu a ideia deste romance, Rui Zink afirmou: «Eu sou conhecido por estabelecer relações um bocado estapafúrdias entre a vida privada e íntima, a relação conjugal, por exemplo, e o inferno ou o Vietname. E, neste caso, é a conjunção disso».

«E ao mesmo tempo - referiu - estou a entrar na idade em que uma pessoa não está muito cómoda no seu corpo... o meu já começa a parecer um campo de batalha - peso a mais, o cabelo está-me a cair, aparecem-me rugas onde não havia, crescem-me pêlos nas costas e nos ombros... é uma desgraça - e isso talvez torne mais fácil, porque nós usamos sempre a nossa experiência, a nossa autobiografia, para lidar com a realidade, eu tentar compreender, que é o que faz um escritor, o estado das coisas, esta guerra contínua, este estado de contínua contingência, de insegurança, que sentimos desde há sete anos, desde o 11 de Setembro».

Admitindo a hipótese de estar «a ser paranóico» quanto ao futuro da humanidade, que define como «um brilhante castelo que pode ruir a qualquer momento», Rui Zink sublinhou: «É desta matéria que se faz o romance, da percepção de que o nosso destino está mesmo muito turístico - aliás, num duplo sentido».

«'O Destino Turístico' joga com destino, aquilo que é a nossa condição e aquilo para onde vamos, e com a ideia do turista, que é alguém que não sabe se as coisas vão correr bem ou mal, é alguém que está só de visita, está só de passagem. E é muito interessante», comentou.

O novo romance de Rui Zink será apresentado por Carlos da Veiga Ferreira, editor da Teorema, e pela escritora Inês Pedrosa, às 17h00, na Fnac Chiado.


Diário Digital / Lusa
 
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