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Em busca do Brasil do Bem(6): entendendo a confusão

Roter.Teufel

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Out 5, 2021
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Em busca do Brasil do Bem(6): entendendo a confusão


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Dois fatos marcaram esta semana. O primeiro no Brasil; o segundo nos Estados Unidos da América. Ambos notoriamente chocantes. No Brasil, o empobrecimento do povo confirmado pela absurda cifra de 33 milhões de brasileiros a passar fome. Nos Estados Unidos, as audiências públicas sobre a invasão do Capitólio em que a Democracia agonizou.

Tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos da América a humanidade se animaliza, se torna bestial, demoníaca. No Brasil, teme-se uma crise constitucional anunciada por quem deveria ser o principal responsável por impedi-la; nos Estados Unidos, a possibilidade de conflito racial sangrento deixa de ser uma possibilidade e a cada dia se torna mais plausível.

Na raiz dos conflitos políticos e sociais dos dois países uma evidência surge, embora muitos se esforcem para escamoteá-la na esperteza de sugar o leite a escassear em úberes murchos. Estamos a assistir o fim melancólico de uma ordem política-econômica que dominou o cenário do mundo ocidental nos últimos 40 anos, conhecida por neoliberalismo ou globalismo financeiro.

Do fim da segunda-guerra mundial até os dias de hoje foram três os movimentos políticos e econômicos a ocupar nossa atenção e a decidir nossos destinos: o “new-deal, a guerra fria e o neoliberalismo. Não pretendo aqui fazer o histórico exaustivo dos três movimentos, mas apenas chamar a atenção para seus aspectos mais salientes, com o único objetivo de expor opções políticas para o Brasil neste ano decisivo para o destino de nossos filhos e netos nas próximas décadas. Aos que se interessem em aprofundar os temas aqui sumariados, recomendo o livro “The rise and fall of the neoliberal order”, de Gary Gerstle, professor de história nos Estados Unidos, publicado recentemente e, que eu saiba, ainda não traduzido para o português. Há um interessante debate do livro com o próprio autor, no Youtube, com legendas em inglês.

O New-Deal, implementado por Roosevelt, permitiu que os Estados Unidos se transformassem na primeira potência militar e econômica do mundo e, como sabemos, num polo de difusão cultural e artística sem par. A classe média americana viveu os anos dourados difundidos com o invejável “american way of life”. Este período em grande parte coincidiu com a chamada guerra-fria, em que a União Soviética era o contraponto a ser contido ideológica e materialmente.

Em grande parte, o medo de que o Comunismo pudesse contaminar o desenvolvimento capitalista favoreceu a implementação de políticas de amparo social e promoção do bem estar das classes trabalhadoras, permitindo-lhes usufruir de conforto compatível com salários previsíveis e ajustáveis. Abstração feita dos problemas de segregação racial que se exacerbam a partir da década de 60 do século passado, a era kenneysiana do “New-Deal” se estende até os anos 70.

A estagnação do lucro e a concorrência internacional vindas de uma Europa e de uma Ásia reconstruídas parecem estar na origem do movimento neoliberal, em grande parte promovido por financiamento privado, interessado em buscar a retomada da espiral da acumulação capitalista. Estamos adentrando, nesta época, nos Estados Unidos, à fase dominada politicamente por um Partido Republicano onde figuras como Goldwater e, muito particularmente, Ronald Reagan tornam-se porta-vozes de uma nova ordem econômica, em que a regulamentação do Estado sobre a politica salarial e social é questionada como impeditiva da liberdade empresarial.

Reagan, eleito presidente no bojo dessas novas tendências, iria notabilizar-se pela drástica redução do imposto de renda sobre as corporações - que passa do teto de 80% a 38% ao fim de seu segundo mandato - e pela eliminação de salvaguardas do bem-estar social com a desarticulação de agências reguladoras e do sindicalismo. Esta tendência se aprofunda e se universaliza nos anos posteriores a Reagan, que não deixou de inocular no desmanche social, a podre semente de que na sociedade americana haveria uma inquestionável divisão racial em que uma raça seria imerecedora dos mesmos direitos atribuíveis à raça branca. É esta clivagem que se aprofunda com a crise das hipotecas em que a financeirização oportunista levou ao esmagamento da classe média americana e sobretudo dos negros e hispânicos nos Estados Unidos.

Trump assume o poder após Obama, um negro que lhe parecia uma anomalia na sociedade americana, e a quem, Trump, em sua visão racista, atribuirá a responsabilidade pelo que considera uma delirante política contra os brancos, em especial o Obamacare, assistência médica universal nos Estados Unidos, ainda que muito aquém do nosso SUS.

Trump, cujas propaladas características de empresário bem sucedido são contestadas por seus pares, chega à presidência após anos de sucesso em programas de televisão de forte conteúdo autoritário. Visivelmente inculto, despreparado, porém com inegável carisma mediático, transporta para o teatro político o circo das lutas corporais e atrai considerável eleitorado ressentido com as perdas históricas de renda e “status” ao longo dos anos do neoliberalismo. Sua última canalhice foi repudiar a própria filha, a quem condena por ter publicamente se dissociado da aventura criminosa do pai.

Jornal do Brasil
 
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