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Dendro Picasso

helldanger1

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Ago 1, 2007
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Já observou quantas pessoas pintam de branco o tronco das árvores? Não são poucas -- pela quantidade, por vezes, acredito que estejam certas! Certa vez indaguei ao prefeito de minha cidade natal o porque de pintar os troncos de branco.

O nobre dirigente respondeu-me: "Cristiano, nossa cidade tem 100% de água tratada, 100% de esgoto, ruas asfaltadas, hospitais com leitos vagos, escolas fechando por falta de alunos etc. Então, pinto postes e guias para mostrar que estou fazendo algo pela cidade. Como as árvores estão próximas, aproveito e pinto também."


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Este mesmo prefeito deixou-me outra pérola digna do mais ouro representante da nação corinthiana, Matheus, quando indagado do porque de plantar falsa seringueira (Ficus elastica) por toda a cidade, sabendo dos problemas que a árvore ocasiona: "Porque em poucos anos torna-se uma árvore centenária!"

Pesquisando sobre de onde vem a tradição cultural de caiar (pintar de branco) os troncos das árvores, descobri que, por volta de 1880, as videiras européias, principalmente as da Itália, estavam sofrendo severos ataques de pragas, especialmente cochonilhas. Algum alquimista da época descobriu que o pincelamento de uma mistura de óxido ou carbonato de cálcio com enxofre nos troncos das videiras diminuía o problema.

Com a imigração européia ao Brasil, a descoberta foi para cá trazida e muitos ítalos, aqui cultivando seus parreirais, por precaução, aplicavam tal processo. Os invejosos tupiniquins, observando o sucesso dos toscanos e calabreses, aplicaram a todas as plantas a substância, inclusive nos postes!

A pergunta que sempre dirigem a mim é: "Faz bem ou mal caiar os troncos?" Fazendo uma analogia, sempre que observo uma árvore, é como se estivesse observando a mais linda das mulheres, mais ou menos como a... Tudo numa planta pode ser comparado ao corpo de uma mulher, dos cabelos que balançam ao vento aos pés descalços que deixam fluir as energias para a terra. Mas como não é o momento de nos aprofundarmos em anatomia, vamos comparar o tronco de uma árvore às coxas torneadas pelo artista natural.

As coxas não somente servem para sustentação e equilíbrio, como alojam um sem-número de feixes nervosos que são responsáveis por vários tipos de reflexos. Além dessa rede elétrica, temos dutos que transportam líquidos vitais, daqueles "contaminados por poluentes" que se dirigem às estações de tratamento (pulmão e rins), como os outros que transportam as mensagens do coração. Para que tudo isso funcione, há necessidade do sopro da vida, onde há vida, há trabalho, com conseqüente produção de gases e/ou calor.

Admita, você nunca pensou nas coxas daquela mulher maravilhosa dessa forma! Mais uma semana lendo os textos deste louco e você terá duas opções: mandar um e-mail ao pessoal do Garden para reclamar ou sua vida mudará completamente. Não sei se para melhor!

O tronco daquela árvore que um dia você pintou de branco -- talvez porque banco é a cor da pureza e você, como sujeito puro... -- tem todos os mecanismos de circulação que as coxas da loira (por que loira? ora!). Pelo tronco, passa sangue venoso e sangue arterial (xilema e floema). Não comparo os dois, pois nunca sei qual sangue é o "bom", ou seja, a seiva elaborada, que são açúcares produzidos nas folhas que serão levados até as raízes para alimentá-las e proporcionar seu crescimento. Já o xilema são os vasos que conduzem a seiva bruta ou "sangue ruim", que nada mais é que matéria-prima (água e sais minerais), que a planta conduzirá à fábrica de açúcares (folha).

A zona periférica de nossa pele é mais via, mais ativa, mais vascularizada que a zona interna. Na planta também é assim, o floema passa pela parte viva da "casca", enquanto o xilema corre mais internamente, sendo a parte interna do tronco praticamente morta.

Como os vasos de maior concentração estão na periferia, tanto na loira, como na planta, nessa região há muita porosidade e muita troca gasosa. Assim, já imaginou se pintássemos nossa loira com cal, como ficaria a respiração de sua pele? (Se bem que muitas empresas do ramo da beleza sacaneiam e...)

Na nossa história, além de anatomia e fisiologia humana e vegetal, a química também envolve-se -- quem cabulou as aulas de laboratório daquela professora branquela que só pegava sol pelo "vitrô", agora terá dificuldades!

A natureza, após alguns bilhões de anos, chegou à loira, e entre inúmeros atributos, investiu sua pele com caráter ácido, assim como evolui concomitantemente a casca das árvores a caráter ácido. A cal, que segundo Aurélio e Pasquale, tem carater alcalino ou básico, podendo chegar a pH (potencial Hidrogeniônico) igual a 11, enquanto a casca tem pH 6,5. Pensando como Lavoisier, teríamos:

Ácido + Base >> Sal + Água

Lembra disso? Quando misturamos um ácido a uma base, produzimos sal e água. Não acredita? Então, faça o seguinte: no dia da festa de aniversário da sua adorada sogra, reúna as crianças e diga-lhes que vai fazer mágicas. Pegue um copo transparente, coloque 2/3 (dois terços) do volume com vinagre, pegue uma colher de sopa bem cheia de fermento químico e verta rapidamente dentro do copo -- torça para que sob a mesa exista aquele tapete persa que sua sogra tanto gosta, pois ela ficará "P" da vida em dobro, pelo tapete e por ter sido a atração principal da festa dela.

Quando a situação acalmar, dentro do copo terá restado água salgada. Aí você pergunta: "quando passamos a cal na árvore, sua casca fica salgadinha?". Não. Na verdade, fica alcalina, pois a quantidade de cal é exagerada e o caráter alcalino da cal é maior que o caráter ácido da casca. Por analogia, não responderei sobre a salinidade do nosso outro personagem, pois sou defensor da moral e dos bons costumes -- ou quase!!

Voltando a falar português, da forma mais clara possível, quando você pinta o tronco de uma árvore, além de impedir alguns processos de troca gasosa, você "queima" a pele da planta com uma "soda".

Peço desculpas aos médicos, pois pouco conheço de anatomia/fisiologia humana. Não peço desculpas às árvores, pois nunca pintei um tronco. Quanto às loiras que por ventura tenham ficado ofendidas, e as morenas, por não terem sido citadas, as desculpas podem ser conseguidas pessoalmente.

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Observe que o tronco da velha figueira é um ecossistema harmônico, que em nada prejudica a árvore. Todas as espécies presentes, filodendros, samambaias, ripsális, musgos, líquens etc., necessitam de pH ligeiramente ácido para sobreviver. Note que o sujeito que pintou o sopé do tronco com cal teve o trabalho de raspá-lo_O falso Picasso trocou a obra-prima natural pela sua obra-prima.

Não entendo nada de pintura, mas sei que existiu um pintor chamado Picasso e que existiu um período ou movimento denominado cubismo, que parece que os pintores gostavam de pintar pés.


Por Cristiano Budreckas

 
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