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A educação que se está a dar aos filhos

Luana

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Vale a pena tirar 5 minutos a ler e reflectir sobre a educação que se
está a dar aos filhos/crianças!

A DEVIDA COMÉDIA / Miguel Carvalho / Criancinhas

Criancinhas
A criancinha quer Playstation. A gente dá. /
A criancinha quer estrangular o gato. A gente deixa. /
A criancinha berra porque não quer comer a sopa. A gente elimina-a da
ementa e acaba tudo em festim de chocolate. /
A criancinha quer bife e batatas fritas. Hambúrgueres muitos. Pizzas,
umas tantas. Coca-Colas, às litradas. A gente olha para o lado e ela
incha. /
A criancinha quer camisola adidas e ténis nike. A gente dá porque a
criancinha tem tanto direito como os colegas da escola e é perigoso
ser diferente. /
A criancinha quer ficar a ver televisão até tarde. A gente senta-a ao
nosso lado no sofá e passa-lhe o comando. /
A criancinha desata num berreiro no restaurante. A gente faz de conta
e o berreiro continua. /
Entretanto, a criancinha cresce. Faz-se projecto de homem ou mulher. /
Desperta. / É então que a criancinha, já mais crescida, começa a pedir
mesada, semanada, diária. E gasta metade do orçamento familiar em
saídas, roupa da moda, jantares e bares. /
A criancinha já estuda. Às vezes passa de ano, outras nem por isso.
Mas não se pode pressioná-la
porque ela já tem uma vida stressante, de convívio em convívio e de
noitada em noitada. /
A criancinha cresce a ver Morangos com Açúcar, cheia de pinta e tal,
e torna-se mais exigente com os papás. Agora, já não lhe basta que
eles estejam por perto. Convém que se comecem a chegar à frente na
mota, no popó e numas férias à maneira. /
A criancinha, entregue aos seus desejos e sem referências, inicia o
processo de independência meramente informal. A rebeldia é de trazer
por casa. Responde torto aos papás, põe a avó em sentido, suja e não
lava, come e não limpa, desarruma e não arruma, as tarefas domésticas
são «uma seca». /
Um dia, na escola, o professor dá-lhe um berro, tenta em cinco minutos
pôr nos eixos a criancinha
que os papás abandonaram à sua sorte, mimo e umbiguismo.
A criancinha, já crescidinha, fica traumatizada. Sente-se vítima de
violência verbal e etc e tal.
Em casa, faz queixinhas, lamenta-se, chora. Os papás, arrepiados com a
violência sobre as criancinhas de que a televisão fala e na dúvida
entre a conta de um eventual psiquiatra e o derreter do ordenado em
folias de hipermercado, correm para a escola e espetam duas bofetadas
bem dadas no professor «que não tem nada que se armar em paizinho,
pois quem sabe do meu filho sou eu». /
A criancinha cresce. Cresce e cresce. Aos 30 anos, ainda será
criancinha, continuará a viver na casa dos papás, a levar a gorda
fatia do salário deles. Provavelmente, não terá um emprego. «Mas
ao menos não anda para aí a fazer porcarias». /
Não é este um fiel retrato da realidade dos bairros sociais, das
escolas em zonas problemáticas, das famílias no fio da navalha? Pois
não, bem sei. Estou apenas a antecipar-me. Um dia destes, vão ser os
paizinhos a ir parar ao hospital com um pontapé e um murro das
criancinhas no olho esquerdo. E então teremos muitos congressos e
debates para nos entretermos.

(Artigo publicado na revista VISÂO online)--------Apenas uma
"correcção" - não é "um dia destes" que "os paizinhos vão parar ao
hospital" – já foi e é agora!
 
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