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Rede de computadores e outros dispositivos munidos de acelerômetros registam terremotos no mundo inteiro

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A crosta terrestre é dividida em placas que fazem atrito e causam sismos / Foto: Universidade Ludwig-Maximilians em Munique, Alemanha

RIO - A Quake-Catcher Network (QCN) é uma rede projectada pela Universidade de Stanford, na Califórnia, com o objectivo de acompanhar eventos sísmicos graças à participação voluntária de usuários de computador que utilizem máquinas com acelerômetro embutido.

Um acelerômetro é um dispositivo capaz de detectar variações de velocidade e medi-las com precisão. Alguns laptops, por exemplo, são dotados de acelerômetro de modo a proteger os componentes mais sensíveis do equipamento, como os discos rígidos. Se, por infortúnio, o laptop cai da mesa, o acelerômetro percebe o súbito aumento da velocidade e automaticamente desactiva o HD, estacionando suas cabeças de leitura-gravação antes que o computador chegue ao chão.

Programa só funciona em momentos de ócio do sistema

Os fabricantes de laptops embutem em seus produtos diferentes tipos de sensores de aceleração. Alguns medem essa grandeza em dois eixos ("x" e "y" - comprimento e largura), enquanto outros monitorizam o eixo "z" (altura).

Qualquer usuário pode se afiliar à QCN, cujo site oficial é Quake-Catcher Network. Basta que possua um equipamento dotado de acelerômetro ou mesmo um sensor externo ligado à sua máquina. O download do software é gratuito e existem versões para Windows e Mac OS. O programa não interfere com os processos em execução pelo usuário, só funcionando nos momentos de ócio do sistema.

Como sabemos, o risco de ocorrência de sismos no Brasil é baixo. Por se situar no meio da placa tectónica Sul-Americana, nosso país é pouco susceptível a terremotos. O último deles, com magnitude 3,1 na escala Richter, ocorreu em Uberaba, MG, em 29 de setembro às 12h30m e foi detectado pelo Observatório Sismológico da Universidade de Brasília (UnB). Em 2007, um terremoto que atingiu 4,9 pontos fez a primeira vítima fatal no país, uma criança de 5 anos, soterrada pelos escombros da casa onde morava. Seis pessoas ficaram feridas na ocasião. O fenómeno aconteceu em Itacarambi, região norte de Minas. O berço do projecto QCN, o campus de Stanford, fica em área de alto risco de abalos sísmicos de grande intensidade.

O sistema da QCN baseia-se no conceito de computação distribuída, uma arquitectura em que certo problema é decomposto em processos separados de cálculo. Estes sub-problemas são resolvidos em separado pelos diversos computadores participantes da rede. No caso da QCN, a ferramenta utilizada no processamento distribuído é a BOINC (Berkeley Open Infrastructure for Network Computing), cujo site é http://boinc.berkeley.edu

Quanto maior o número de colaboradores, mais precisa a rede se torna

A rede dos caçadores de terremotos será tão precisa quanto maior for o número usuários oferecendo o sensor de seu equipamento para o experimento colectivo. No caso de um grande terremoto, um único sensor localizado próximo ao epicentro poderá disparar um alarme à rede, iniciando o registro do abalo e a avaliação de sua magnitude.

Com relação ao local exacto onde se situa cada sensor, a QCN ou utiliza o GPS embutido em cada dispositivo cadastrado ou recebe do usuário o link Google Maps corresponde à sua coordenada geográfica. Outra forma de obter as coordenadas de um dado sensor pode ser através da posição em que está o servidor internet mais próximo. A precisão não é muito grande, mas analisando os dados de vários sensores na mesma área é possível descartar erros estatísticos e sistemáticos nessa amostragem específica.

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Sistema QCN mostrando terremoto na Nova Zelândia / Foto: Reprodução

Uma das metas da rede é permitir que seja emitido um alerta de terremoto, mesmo que apenas com alguns segundos de antecedência. Esse pequeno intervalo pode salvar vidas, pois as pessoas podem se abrigar em locais mais seguros ou, senão, afastar-se de pontos perigosos num aposento, como por exemplo vidraças.

O menor sismo já registado pela QCN teve magnitude 3,8 na escala Richter e ocorreu próximo a Los Angeles. Já o maior teve magnitude 5,4 e aconteceu na mesma região.

Um dado importantíssimo na construção desse banco de dados sismológicos é a informação exacta de tempo, algo difícil de obter se a QCN dependesse apenas da data-hora constando nos relógios internos dos computadores cadastrados. Considerando a excessiva variação da hora nos vários equipamentos da rede, para unificar tanto quanto possível essa informação, a QCN acciona a cada 15 minutos o protocolo de tempo existente no servidor central de modo a controlar o grau de flutuação de cada "clock".

A expectativa é que a rede QCN cresça bastante, talvez um dia cobrindo as áreas mais ou menos habitadas do mundo inteiro. Considerando que os sensores sísmicos estão barateando cada vez mais e já vêm de fábrica em laptops, a tendência é que a rede ainda se expanda muito.

QCN é mais barata que que as redes académicas existentes

Em comparação às redes sísmicas académicas e corporativas já existentes, a QCN é bem mais barata. Em primeiro lugar, o preço dos sensores vem baixando consistentemente. Além disso, todo o trabalho de digitalizar os registos sísmicos, de detectar movimentos violentos na crosta terrestre, e de transferir os dados para o servidor central é feito nos computadores dos voluntários, liberando os servidores da rede dos Quake-Catchers.

Outro forte redutor de custos é o fato de a QCN não precisar instalar, manter e consertar os sensores sísmicos da rede, tarefa muito onerosa nas redes tradicionais de sísmica.

Pelo fato de não serem sensores sofisticados, os acelerômetros existentes nas máquinas dos voluntários só captam eventos sísmicos locais, pois são muito menos poderosos e sensíveis do que os utilizados em pesquisa científica, capazes de avaliar magnitude e epicentro de sismos ocorridos no outro lado do planeta.

Sismógrafos convencionais são equipamentos muito caros, os mais simples custando no mínimo US$ 10 mil cada. Já os chips acelerômetros são bem mais baratos, sendo uma evolução dos circuitos accionadores de airbags em veículos, no caso de colisão. No entanto, justamente pelo seu preço, tornaram-se componentes fáceis de encontrar em vários modelos de laptop hoje em dia, como notebooks Mac (após 2006), os ThinkPads (após 2003 - a IBM chama o sistema de HDAPS, ou Hard Drive Active Protection System) e alguns Toshibas da linha Portege. Para minha tristeza pessoal, os laptops Dell Latitude não possuem acelerómetro.

Rede só julga abalos quando vários sensores se activam

Os tocadores iPod Touch, iPod Nano (4a geração), alguns Tablet PCs, telefones como iPhone, Nokia N95, N73, Sony Ericsson W580, W910, K850i, C902, alguns modelos de celulares Symbian e controles remotos de videogames, como o Wii, são dotados de acelerômetro. Mas nenhum desses pode participar da QCN.

A localização dos computadores participantes da rede influi no tipo de dado com que pode contribuir no registo de um abalo. Um laptop no andar térreo de um prédio é mais preciso para captar as vibrações do terremoto. Mas o mesmo laptop situado num andar alto do prédio pode sinalizar os movimentos da estrutura, fornecendo dados importantes sobre as forças em ação e a magnitude do sismo.

Numa situação de normalidade, ou seja, sem terremoto, a eventualidade de um certo laptop cair no chão não causará alarme à QCN pois a rede só julga que um abalo sísmico é real quando vários sensores numa dada região começam a relatar simultaneamente o mesmo tipo de perturbação.

Outro benefício da rede dos Quake-Catchers é que ela permitirá a construção de mapas mais detalhados dos movimentos horizontais e verticais induzidos por terremotos. Tal mapeamento pode dar pistas valiosas sobre a morfologia das camadas subterrâneas de uma região, além de permitir um planejamento urbanístico mais realista em áreas sujeitas as sismos e de ajudar no projeto de construções erigidas em regiões assim.

Por ainda estar num estágio inicial, a rede de caça-terremotos ainda não se mostra capaz de detectar e localizar tremores em menos de 10 segundos. Mas esse intervalo tende a diminuir bastante com a adesão de novos voluntários. Se a QCN crescer o suficiente poderá registar sismos em maior detalhe que a rede atual de sismógrafos tradicionais. Até agora, o projeto tem pouco mais de 1.500 voluntários cadastrados.


Publicada em 06/10/2008
Carlos Alberto Teixeira
em O Globo
 
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